Iniciativa de logística reversa em São Paulo pretende reciclar 20 t de retalhos por dia
Todos os dias são geradas 20 toneladas de retalhos de tecido nas confecções do Brás e do Bom Retiro, região central de São Paulo. O material que é colocado nas calçadas e recolhido por caminhões com o lixo comum.
No entanto, esses pedaços de pano podem se tornar um insumo importante na fabricação de sofás, colchões, mantas acústicas, barbantes e até automóveis. Neste último caso, por exemplo, o espaço entre as paredes internas e externas do veículo pode ser preenchido com feltro produzido a partir de retalhos.
Aproximar fabricantes que dispensam retalhos dos que precisam dele para tocar seu negócio é a ideia do Retalho Fashion, projeto do Sinditêxtil, que reúne fabricantes de roupas, da Prefeitura de São Paulo e de duas empresas interessadas nessa matéria-prima.
Trata-se da primeira iniciativa de logística reversa criada na cidade. Neste modelo, as empresas ficam responsáveis por recolher os resíduos gerados na fabricação e no uso de seus produtos.
A Secretaria de Assistência Social cedeu um terreno no Bom Retiro, onde o material será separado e prensado em fardos. De lá, o produto seguirá para duas fábricas. “O termo de compromisso deve ser assinado até junho. A triagem será feita em uma tenda reforçada, de rápida implantação”, afirma o secretário municipal de Serviços, Simão Pedro Chiovetti.
“A expectativa é que tudo esteja operando até o segundo semestre”, diz Alfredo Bonduki, 55, presidente do Sinditêxtil-SP, que reúne produtores de tecidos e de roupas. No mesmo lugar, haverá oficinas de artesanato com tecido para a população.
A separação eleva o valor dos retalhos, pois cada corte tem seu preço: um quilo de jeans vale R$ 0,15, enquanto as lascas de tecido sintético, como o poliéster, rendem R$ 0,60 o quilo.
“Se for um tecido de uma cor da moda da estação, o quilo pode custar até R$ 2”, diz Carlos Júnior, proprietário da JF Fibras, uma das empresas envolvidas no projeto, estabelecida na zona industrial de Suzano, na Grande São Paulo. Atualmente, Júnior recebe os retalhos que são recolhidos pelos catadores individualmente.
Na fábrica de Júnior, os retalhos chegam em sacos, são partidos em pedaços menores e colocados em uma máquina italiana de 20 metros de extensão. A cada dez minutos, 200 quilos de retalhos são transformados em um fardo de mantas de tecido, prontas para serem revendidas a outras indústrias.
Nas ruas, a separação é feita por catadores, que abrem os sacos em busca das fibras mais rentáveis. “O material que cai na calçada acaba indo para o bueiro e gera enchentes”, afirma Bonduki, do Sinditêxtil.
O percentual de lixo reciclado na cidade avançou de 1,6% em 2014, para 4% do total neste ano, o que equivale a cerca de 500 toneladas por dia. “As novas centrais mecanizadas de triagem operam abaixo da capacidade máxima, pois a adesão à coleta seletiva ainda é baixa”, explica o secretário Simão Pedro.
De acordo com ele, 70% das residências são atendidas por caminhões que recolhem apenas lixo reciclável. A meta da gestão Haddad é atingir 10% de coleta seletiva até o ano que vem.
Novas iniciativas de logística reversa podem ajudar a ampliar este número, como um acordo nacional entre governo e fabricantes de embalagens. “Cerca de 70% do lixo reciclável é de embalagens usadas”, diz o secretário.
LOGÍSTICA REVERSA
A logística reversa foi estabelecida por uma lei federal criada em 2010, mas avança de forma lenta porque não foram definidos prazos para a adequação das empresas. Uma das explicações para a morosidade é que, para colocá-la em prática, é necessária a interação entre empresas e governo.
O Retalho Fashion, por exemplo, é negociado há três anos e envolve cinco secretarias municipais (Assistência Social, Serviços, Subprefeituras, Segurança Urbana e Verde e Meio Ambiente). Os principais entraves foram a demora em achar um terreno no centro para sediar o projeto e definir quais tarefas ficariam de responsabilidade de cada entidade.
No projeto, ficou definido que a coleta e a operação serão realizadas por uma cooperativa formada por catadores que já atuam na região. O uso de bicicletas adaptadas está em estudo para diminuir a poluição gerada. “O ganho ambiental com a reciclagem diminui quando usamos caminhões para levar o material, além de encarecer o frete”, diz Bonduki, do Sinditêxtil.
A JF Fibras e a Ober, de Nova Odessa (a 122 km da capital), bancaram a instalação da estrutura, estimada em R$ 200 mil, e a expectativa é que a venda dos retalhos seja suficiente para custear todos os gastos de operação e a remuneração dos trabalhadores.
Depois de processado nas fábricas, o quilo do material gerado a partir do jeans é vendido por até R$ 1,60, mais de dez vezes o preço do retalho puro.
Apesar de ser um grande produtor de tecidos, o Brasil importa retalhos de outros países, como Honduras, onde são produzidas roupas de etiquetas americanas.
Em alguns casos, sai mais em conta trazer um contêiner repleto de retalhos ou roupas usadas de outro país do que montar uma estrutura para recolher e transportar o material de um Estado a outro dentro do território nacional.
Após a implantação do Retalho Fashion, há planos para passar a recolher uniformes de empresas e de órgãos como a Polícia Militar, cujos trajes não podem ser descartados no lixo comum por questão de segurança.
Enquanto se desenrolam os trâmites finais para tirar o projeto do papel, como a formalização da cooperativa, o empresário Carlos Júnior adquiriu mais uma máquina para processar os retalhos e continua a receber material dos catadores. “Sigo comprando mesmo sem encomendas, pois essas pessoas [catadores] vendem o almoço para pagar a janta.”
Fonte: www1.folha.uol.com.br
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